O velório do sambista Arlindo Cruz, morto aos 66 anos, acontece neste sábado (9), na quadra da escola de samba Império Serrano, em Madureira, na zona norte do Rio de Janeiro. A despedida do artista segue o formato do gurufim, um ritual tradicional afro-brasileiro que mistura luto e celebração da vida.
Trazido ao Brasil por pessoas africanas escravizadas, o gurufim é uma cerimônia festiva realizada após a morte de alguém, marcada por música, dança, bebida e alegria. No caso de Arlindo, a homenagem deve se estender até as 10h de domingo (10), conforme informou a agremiação.
Segundo o historiador Luiz Antonio Simas, o termo “gurufim” tem origem em tradições africanas e faz referência ao golfinho, animal que, em algumas culturas, conduz as almas ao mundo dos mortos. Em vídeo publicado em seu canal no YouTube, Simas explica que o ritual celebra a passagem e a memória do falecido, com elementos que unem o sagrado e o profano.
Durante os rituais, era comum os participantes perguntarem em tom de brincadeira: “Gurufim veio?” — e um coro respondia que não, enquanto outros nomes de animais marinhos eram evocados, num jogo cênico que expressa dor e, ao mesmo tempo, resistência cultural.
Nos últimos anos, o gurufim também esteve presente nas despedidas de figuras importantes do samba, como Bira Presidente (fundador do Fundo de Quintal), o jornalista Sérgio Cabral, o baluarte da Portela Monarco, e a cantora Beth Carvalho.
A importância desse ritual na cultura do samba é tamanha que foi eternizada em canções. Na faixa “Gurufim do Cabana”, Martinho da Vila homenageia o sambista Cabana, morto em 1986, descrevendo seu velório na quadra da Beija-Flor de Nilópolis:
“A tradição africana manda a gente cantar de qualquer maneira, e quando o Cabana subiu, o gurufim dele foi na quadra da sua escola de samba […] começamos a cantarolar as músicas do grande compositor.”
Com o gurufim, Arlindo Cruz é celebrado como viveu: ao som do samba, entre amigos e com reverência às raízes da cultura afro-brasileira.