“É um DNA compatível com o agressor”, disse, nesta quarta (7), um dos médicos forenses que examinaram a jovem que acusa o jogador Daniel Alves de estupro no banheiro de uma boate em Barcelona, na noite de 30 de dezembro de 2022.
Alves enfrenta o terceiro e último dia de seu julgamento. A sentença deve demorar alguns dias para ser decidida. Há grande expectativa sobre seu depoimento, que deveria ter acontecido na segunda-feira, mas foi adiado por dois dias.
Peritos e uma médica do hospital que atendeu a jovem há cerca de 13 meses foram os primeiros testemunhos desta quarta. Em relação ao DNA, o médico informou que ele não foi obtido por meio de sêmen. “Não há restos de sêmen porque provavelmente não houve ejaculação”, disse.
Segundo o perito, a amostra poderia ser esmegma, uma secreção branca e pastosa que contém “muito mais carga genética” do que saliva. A amostra foi extraída da suposta vítima três horas depois do ocorrido.
O mesmo perito, convocado pela defesa, destacou ainda a falta de ferimentos compatíveis na suposta vítima. “Ela fez um relato sobre tapas, agarramentos no pescoço… Mas não vemos nenhum ferimento assim em nenhuma parte do corpo”, afirmou o perito.
“Disse que sentia uma dor intensa ao urinar. Na minha experiência pessoal, quando ela nos conta que foi uma relação sexual dolorosa, é muito estranho que não encontremos nada. A ausência até mesmo de inchaço [na região íntima] me faz pensar que a relação sexual não foi tão traumática”, afirmou.
Mais cedo, outro médico havia falado sobre a falta de lesões vaginais, o que não significa que não tenha havido violência. “Se há ou não lesão, não podemos dizer se é consensual ou não. Não podemos fazer essa comparação”, afirmou o perito.
“Mais lesões são encontradas em relações sexuais não consensuais do que em relações sexuais consensuais. Neste caso, não encontramos ferimentos, mas não podemos afirmar que não houve agressão”.
Sobre o machucado nos joelhos da vítima, um deles disse que “estamos lidando com atrito, pode ser por queda, mas também ao esfregar em uma superfície áspera”.
A psicóloga forense, por sua vez, afirmou que a versão da denunciante se ajusta claramente às conversas que tiveram juntas. “Vê-se uma série de sintomas que vão ao encontro daquilo a que a pessoa se referiu no momento da entrevista. Estávamos frente a um quadro pós-traumático”, disse.
“Ela teve um rompimento, choque e impacto e muitos aspectos da vida e daquela pessoa estão desfigurados. E não tivemos nenhuma indicação de que a pessoa estivesse exagerando ou fingindo”, acrescentou a perita.
A psicóloga também destacou alguns dos critérios para determinar o nível de estresse pós-traumático. ” A jovem se sentia culpada, o que é um indicador claro do estado de vítima. Isso geralmente está associado ao estatuto de vítima. Quando ela ouvia português, ficava muito nervosa. Não tinha vontade de pensar em questões relacionadas ao seu trabalho. E estava em estado de hipervigilância, com falta de sono.”
Como na terça, o jogador vestia um suéter claro de gola alta e acompanha os testemunhos de forma séria, com as mãos entrelaçadas, sentado em uma cadeira atrás da mesa onde os depoentes se sentam para falar. Alves entrou no local com algemas, colocadas com suas mãos para a frente, que foram retiradas quando ele sentou.
Nos dois primeiros dias, foram ouvidas 28 testemunhas, incluindo a mulher que o acusa, além da prima e da amiga que a acompanhavam. Falaram ainda funcionários da boate Sutton, policiais que atenderam a suposta vítimas e amigos que beberam com Alves durante aquela noite.
O último depoimento de terça foi o da mulher de Alves, a modelo espanhola Joana Sanz. “Ele chegou em casa muito bêbado, cheirando a álcool. Ele bateu no armário e caiu na cama. Não valia a pena falar com ele quando ele chegou, era melhor deixar para o dia seguinte”, disse ela.
Na Espanha, o crime de estupro tem pena máxima de 12 anos, se não houver agravantes. A acusação pede os 12 anos e a defesa, a absolvição.
Atenuantes, por sua vez, podem cortar a pena até pela metade. Há duas estratégias em andamento pela defesa. Uma delas, o “atenuante de reparação de dano causado”, foi o depósito de € 150 mil (cerca de R$ 800 mil) na Justiça, que deverá ser revertido para a jovem, caso ele seja condenado. Caso Alves seja considerado inocente, o dinheiro voltará para ele.
A outra diz respeito a alguns artigos do Código Penal que estabelecem o uso de substâncias como um atenuante. Sem especificar o tipo de crime, um artigo estabelece que pode estar isento de responsabilidade criminal “quem, no momento da prática do crime, encontre-se em estado de completa embriaguez devido ao consumo de bebidas alcoólicas (…)”.
Um segundo artigo afirma que, “quando houver apenas uma circunstância atenuante, aplicar-se-á a metade da pena prevista na lei para o crime”.
De fato, a defesa focou nessa questão ao fazer perguntas aos amigos do jogador na terça. “Foi Alves quem mais bebeu no restaurante [antes de irem à discoteca]?”, perguntou a advogada de defesa, Inés Guardiola, ao amigo Bruno Brasil, que estava presente no momento do suposto crime. “Sim”, ele respondeu.
Culpar a bebida, entretanto, pode ser vista como a quinta versão do jogador sobre aquela noite. Na primeira, o brasileiro havia afirmado que não conhecia a mulher. Depois, disse que entrou no banheiro com ela, mas nada aconteceu. Na terceira, afirmou à Justiça que houve apenas sexo oral. Na sequência, declarou que houve penetração, mas com consentimento. Agora, que o fez sob efeito de álcool.
A imprensa tem acompanhado as sessões em três salas da Audiência de Barcelona, nas quais se podia assistir ao julgamento por meio de um circuito fechado de televisão. Credenciaram-se 270 jornalistas.